Há já mais de um mês o sempre imperdível NPTO publicou mais uma das suas também imperdíveis resenhas, desta vez sobre “Deus não é grande – como a religião envenena tudo” de Christopher Hitchens. Hitchens é conhecido como um dos “New Atheists“, juntamente com Richard Dawkins, Sam Harris, e Dan Dennett, dos quais eu só não li ainda o último.
O Nepê, assim como o Idelber antes dele, já havia publicado uma série de posts sobre “Deus: um delírio” de Dawkins (partes 1, 2, 3, 4, 5, 6, e 7), os quais, para minha tristeza só vim a conhecer com grande atraso.
Embora tenha colado, o rótulo “New Atheists” é profundamente enganoso, ao sugerir que se trata de um grupo no sentido mais estrito do termo. Quase como que uma seita religiosa. É claro que para seus detratores, e esses são muitos, é disso mesmo que se trata: os “novos” ateus seriam tão (ou até mais) fundamentalistas quanto aqueles a quem criticam.
Para Sam Harris contudo, a própria palavra ‘ateu’ é desnecessária, assim como não temos um termo para quem não crê em astrologia, ou alquimia (ou fadas (a-fadista?) diria Dawkins). Segundo ele:
“..’ateismo’ não é uma filosofia, e nem mesmo uma visão de mundo, mas simplesmente uma recusa a negar o óbvio..”
É verdade que há grandes pontos de contato entre esses autores: são todos óbviamente ateus, acham que religião, ou as religiões são ruins, que muitos problemas do Mundo são causados pelas religiões, e portanto o Mundo sem religião seria um lugar melhor, etc. Todos escrevem bem (IMHO), seus livros foram lançados mais ou menos na mesma época (The End of faith, de Harris em 2004, The God Delusion, de Dawkins em 2006, e God is not great em 2007), e são campeões de vendas. Contudo eles estão longe de serem um grupo coeso, unidos por algum tipo de doutrina, como quer sugerir o rótulo “New Atheists”, Dawkins e Hitchens por exemplo ficaram em lados opostos na questão da invasão do Iraque (Hitchens apoiou), o que não é pouco, e seguramente não existe nada como um Ateu Supremo, ou um Livro Sagrado dos Ateus.
Acredito que no máximo se pode caracterizar a coisa toda como um fenômeno. E para entender esse fenômeno, me parece que tem faltado aos críticos e observadores um pouquinho de perspectiva histórica (mal de que também padecem os “novos ateus”, mas trato disso mais adiante). Isto é, esses livros, todos lançados com poucos anos de intervalo, podem ser melhor entendidos como uma reação (necessária IMHO) à crescente influência e poder da direita religiosa, cuja ascenção, em conluio promiscuo com a direita não-religiosa, pode ser traçado no mínimo à partir do final dos 70, com a ascenção do Papa João Paulo II, e as eleições de Margaret Tatcher (UK) e Ronald Reagan (EUA), e atinge seu ápice na Presidência de George W. Bush Jr. The End of Faith: Religion, Terror, and the Future of Reason (em português pela Cia das Letras), de Sam Harris, por exemplo, foi explícitamente escrito sob o impacto dos ataques de 11/09/2001. Isso sem falar da longa batalha que já vem sendo travada há décadas nos EUA, por grupos de inspiração religiosa que se opõem ao ensino da Evolução, a ponta do iceberg de uma agenda político/religiosa mais ampla. E considerando que Dawkins, sendo biólogo, vem lutando nessa guerra em particular há mais tempo (a maioria dos seus livros, inclusive o último, trata do assunto de uma forma ou de outra) , não acho que seja de estranhar sua estridência, à qual alguns, como o filósofo Massimo Pigliucci, contrapõem a serenidade de um Carl Sagan, em Variedades da Experiência Científica uma visão pessoal da busca por Deus, publicado em 1985. Acho lícito perguntar se, fora questões de temperamento pessoal, Sagan mostraria tanta serenidade se tivesse que enfrentar pressões de grupos bem financiados a favor do ensino do Geocentrismo, como teoria alternativa válida. Ou visto o governo de Bush Jr….
Também não é exatamente como se não existissse uma vastíssima literatura de apologia religiosa, não houvesse uma crescente ocupação religiosa de espaços da vida pública, e não fossemos bombardeados cotidianamente por proselitismo religioso, no rádio, na TV, e até nos lugares mais inesperados. Ah, mas aí tudo bem, contudo, bastam uns poucos autores escreverem livros criticando as religiões e são logo todos uns ateus fundamentalistas intolerantes. Eu queria que alguém me explicasse o que seria um ateu não-fundamentalista? Um ateu calado talvez?
Quando o NPTO diz
quem disser que tem uma prova científica da existência de Deus, ou coisa que o valha, está de sacanagem com a sua cara
ele está certo, o problema é que tem gente que faz exatamente isso, com relativo sucesso, e respeitado por gente boa. De fato esse tipo de apologia religiosa se insere na tradição da Teologia Natural, que busca mostrar a presença de Deus, através do exame do Mundo, onde se mostrariam traços Dele. É com essa tradição que Dawkins debate.
Ainda segundo o NPTO:
O que o Dawkins, por exemplo, faz, é postular os fatos conhecidos pela ciência como axiomas, e depois deduzir a probabilidade de cenários metafísicos a partir deles
Eu posso estar muito equivocado, mas não é isso que o Dawkins faz na minha opinião. Ele faz exatamente o contrário, ele tira deus dos abismos da especulação metafísica, e tras para debaixo do microscópio. A questão central de “Deus: um delirio” é: ‘Deus existe?’ é uma questão que pode ser submetida ao escrutínio da ciência?’ Dawkins responde que ‘sim’ e continua à partir daí, até o “Argumento do 747 Definitivo”.
Ok, você pode discordar da questão de princípio, dizer que “Não! ‘Deus existe?’ não é uma questão que possa ser respondida pela Ciência”, ou “a Ciência não tem nada com isso”, e sair gritando pela rua “nonoverlappingmagisteria!”, “nonoverlappingmagisteria!“, e daí todo o conceito do livro cai por terra. O livro e a própria idéia de Teologia Natural também por sinal. Mas…..se se aceita a premissa de que a questão ‘Deus existe?’ pode ser respondida, ou pelos menos examinada pela Ciência (o que eu não acho fácilmente descartável como verei a seguir), então o “Argumento do 747 Definitivo”, de fato uma aplicação da Navalha de Okham, me parece bem sólido, ou no mínimo é para ser levado a sério.
O mais razoável que já eu vi contra isso foi, ninguém menos que O Willian Lane Craig, o Lord Sith dos apologistas cristãos, e que por sinal já fez picadinho do Hitchens, entre outros, aborda a questão. Só que depois de gastar a maior parte do tempo distorcendo os argumentos do Dawkins, o máximo que ele consegue contrapor é alegar que , já que coisas complexas são aquelas que possuem várias partes (aqui Craig está usando, e abusando de uma definição de complexidade do próprio Dawkins em O Relojoeiro Cego), então ‘Deus é simples’, pois ‘Deus é uma mente incorpórea, logo, não possui partes’. Ou seja, o cara não apenas sabe que Deus existe, como conhece Sua constituição. Me parece, portanto, que a acusação de que são os ateus montam uma
banca de que sabem alguma coisa que os outros não sabem
está, no mínimo com o sinal trocado.
Continua….
Concordo com o Gato – sempre brilhante!
A ciência deve mesmo continuar tentando provar a existencia de uma força maior. Só quando isso acontecer deixaremos de ser intolerantes.
Parabéns!
Estranho… Eu pensava que toda essa gente com fé em Deus, que vive sua vida em função disso, tinha certeza que ele existia. Provas científicas, evidências? Eles não precisam disso. É isso que torna sua crença de caráter duvidoso, e é isso que apontam os “neo-ateus”. Muitos de seus críticos não entendem isso porque não querem entender, só pode!
http://www.intelligencesquared.com/iq2-video/2009/atheism-is-the-new-fundamentalism
Acho que você vai gostar.
Valeu. Eu já tinha visto.
[]’s
Fala amigo, Gato precambriano!
Sou Fabenrik do Ateu e à toa, um blog de humor ateísta.
Estava lendo a postagem que saiu no Index, do Daniel, parceiro tbm do meu blog, e resolvi olhar se blog, e tomei um susto com o título… rsrs
Seu blog é muito bom mesmo, textos muito bem elaborados, exatamente o tipo de link que gostaria de ter por lá, e gostaria de propor uma troca de links ou banners.
Desde já agradeço
Fabenrik
Ateu e à toa
Atheist College
Caro fabenrik
Muito obrigado pelas gentis palavras. Apareça sempre!
É claro que podemos trocar links ou banners, mas é que sou novo nessa história de blogs, então não estou familiarizado com os procedimentos. Me diz como se faz e a gente encaminha.
[]’s
Se for troca de banners, se não tiver um, eu faço um para ti, só que vai ser no Paint (não fica ruím), e tu copia o código html do meu banner no meu blog e cola no seu, se for troca de links, o seu já está lá e é só colocar o meu no seu blog.
O que lhe for mais conveniente.
Oi fabenrik
Acabei de colocar o ‘Ateu e à toa’ (muito bom por sinal) na relação de links, com o restante da Fauna.
O banner vai ter que esperar um pouquinho.
[]’s
Muito obrigado!
É um orgulho para mim e as pessoas que fazem parte do AeA ouvir isso de ti, uma vez que seu blog é muito bem feito.
Agradeço mais uma vez.
Fabenrik
ateu e atoa